Escrevo exatamente hoje, na data que convencionaram ser dos pais, justamente para conversar a respeito da formalidade e o grau a que ela pode chegar, de tão a sério que as pessoas levam tal instituição.
Tal data, a exemplo de tantas outras, teve um propósito nobre de início, mas o mesmo perdeu-se a ponto de hoje ser mais comercial do que qualquer outra coisa. Não vou me alongar a respeito, até porque dona Wikipedia explica melhor do que eu tal coisa. Porém, não deixa de ser interessante ver que só aqui e em Samoa é que se comemora tal data no segundo domingo de agosto. Algo te chamou a atenção ao ver que é dois meses depois das festas juninas e três meses após o Dia das Mães, data essa que também foi esconjurada por quem a criou? Em outras partes do mundo há uma ligação religiosa, pois é a comemoração do dia de São José, pai de Jesus.
Pois bem, não vou mais digredir, apenas irei me ater ao tal formalismo, coisa que neste dia exacerba-se bastante. Em parte deve-se à ignorância do povo, que crê piamente que você só tem consideração por alguém se seguir todo um protocolo, esquecendo-se completamente de o quanto que é uma pessoa carinhosa para com os outros todos os outros dias do ano e todos os outros dias da vida. Sempre que um problema acontecia, lá estava o informal para resolvê-lo, enquanto o formal tentava enquadrar em algum roteirinho.
Extrapolando datas, o formalismo também se manifesta na condenação de atitudes espontâneas. Morre ente querido de alguém a quem muito preza e logo o informal já apresenta as condolências e se prontifica para o que aquela pessoa abalada precisar. O formal sabe disso e imediatamente condena a prontidão, dizendo que deveriam esperar um pouco. A recompensa do informal acaba sendo o agradecimento dos que estão fúnebres e nota o quão sinceros são aqueles agradecimentos.
Óbvio que há momentos na vida em que você precisa ser formal. Nada é mais formal do que um casamento e, dependendo da ocasião, você acaba tendo de ser mais formal ainda. Porém, é formalidade autoexplicável e perfeitamente contextualizada. O que falo aqui é de quando a formalidade vira um vício, passando a ser formalismo com esse "ismo" tendo um sentido quase de doença. Porém, que ninguém confunda aí com transtorno obsessivo-compulsivo ou outros males que realmente são doenças, até porque é provavelmente nem um psicólogo ou um psiquiatra acharia digno de considerar como tal. Porém, pode não afetar quem pratica tal coisa mas, como uma doença, afeta quem está ao redor.
Não desejou um feliz dia de não sei o quê pelo fato de não acreditar que tal data tenha uma real utilidade? Passou a ser o pior dos seres humanos do mundo, mesmo que em todos os outros dias aja em prol daqueles que estão próximos. É só um exemplo simples, dentre muitos outros que se poderia enumerar. E tanta formalidade acaba impedindo que você tenha uma vida normal. Tudo passa a ter de seguir um roteirinho e, se disso sair, logo gera uma série de condenações a quem fez exatamente a mesma coisa, exatamente da mesma forma e exatamente sem fazer mal a alguém. Só mesmo ao formalista, mas aí sem ser culpa de quem não tem um protocolinho para seguir.
Olhamos na mídia uma série de impropérios ditos da maneira mais formal do mundo e até rimos deles. Não é hilário ver gente das mais altas esferas políticas dizendo algo como "Vossa Excelência é não sei o quê", "a mãe de Vossa Excelência é isso e aquilo"? De minha parte, sento no chão e rio, pois eles mesmos obcecaram-se tanto por formalidade que não se dão conta do quão ridículos estão sendo. Tudo bem que no cargo que ocupam é mesmo preciso seguir um protocolo, mas não deixa de ser algo mais humorístico do que o que é realmente feito para se rir de.
E tanta formalidade impede a felicidade, não só do formalista como também de quem estiver a seu redor. Quantos aqui não se sentiram proibidos de ser felizes por causa do formalista de plantão? Um sorriso? Um formalismo. Uma alegria momentânea, um desafio superado? Não perguntam do estado da alma, mas sim jogam de volta à formalidade.
Daí os formalistas reclamam da cara fechada. Ué, mas não estavam reclamando do sorriso? Com isso, nada de cara triste e tudo para fazer cara de nada. Agora sim, ninguém pode reclamar. Se bem que em certo ponto os formalistas podem até ajudar, pois fazer cara de nada é extremamente útil em ambientes nos quais as pessoas tentam adivinhar em que se está pensando. E aí, naquela cara de nada, por dentro se ri (e também se tem ataque de riso) dos incríveis erros de julgamento que os outros cometem sobre o que se está pensando.
Porém, quando se está em si, entra aquela tristeza do quanto que o formalismo prejudica a naturalidade das relações humanas. Se você for formalista, que saiba o quanto que suas implicâncias prejudicam as vidas alheias. Quando aos formalizados, fica a solidariedade.